Sentar em “W” (w-sit) refere-se a postura assumida quando a criança
senta-se no chão, com as pernas posicionadas no formato de um W (veja a
figura). Esta é uma das muitas posições que uma criança pode assumir
enquanto brinca sentada. Em relação a isso, não há nada de errado, pois é
normal que a criança transite entre diversas posturas enquanto
participa de brincadeiras. De fato, a alternância entre posturas é
extremamente benéfica para a criança, pois as transferências entre uma
postura e outra ajudam a desenvolver os músculos do tronco e,
principalmente, ajudam a formar as primeiras noções de equilíbrio e
consciência corporal.
No entanto, se a criança assume insistentemente
a postura em “W”, então esta preferência pode vir a gerar problemas não
só ortopédicos, mas também em relação ao desenvolvimento motor normal.
O que a criança aprende enquanto brinca sentada
Como
exemplificado acima, é normal que a criança modifique constantemente
sua postura durante uma atividade lúdica, assumindo inclusive a postura
em “W”, sem que isso seja considerado prejudicial. Quando brincam desta
forma, as crianças desenvolvem e aprimoram o controle muscular, assim
são capazes de realizar rotações de tronco, inclinações, transferências
de peso laterais, reações de proteção e trabalham também a dissociação
de cinturas. Estas habilidades são primordiais para o desenvolvimento
motor das crianças, influenciando inclusive o desenvolvimento da
dominância manual.
A relação entre controle de tronco e o
desenvolvimento das habilidades manuais pode não ser imediatamente
visualizado, porém é verdadeiro e essencial para o planejamento da
estratégia terapêutica em crianças com disfunção neuromotora. Este
assunto é muito bem explorado no livro “exatamente no centro” da
fisioterapeuta norte americana Patrícia Davies (leitura recomendada para
todos que pretendem se aprimorar em fisioterapia neurológica). Neste
sentido invoco o dogma fisioterapêutico: “Para se ter um bom controle
distal é preciso ter boa estabilidade proximal”. Em outras palavras,
para escrever, utilizar talheres, ou qualquer outra atividade que exija
controle distal, é preciso que o tronco seja estável e ofereça boa
sustentação aos músculos que vão movimentar o braço.
Assim, se uma
criança varia suas posturas sentadas e desenvolve o controle postural de
tronco, então esta boa estabilidade proximal irá oferecer um melhor
controle dos membros superiores permitindo que elas manipulem livremente
os brinquedos e desenvolvam suas habilidades manuais.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjEkWeu6KzGPNoANrnXdKjzc6NqUfycdellCi8petR_rVyFOEmWcc3eyqGmzXqlTi-lOIqvOAA7sYYrSSXXsDIeGMtPBHzd7aSHF-ipTVN-b4yRypJVWOAIgw4F7HT5nAtXXmpQYV_YOao/s400/wsit.jpg)
Isto
explica aquela estória meio doida de que as pessoas que não
engatinharam têm dificuldades em usar a tesourinha para cortar papel.
Não sei se você já ouviu isso antes, também não sei se isso é uma
verdade ou se é só mais um dos mitos e lendas da fisioterapia, mas se
considerarmos que o engatinhar ajuda a fortalecer os músculos abdominais
(proximais), me parece razoável assumir que esta lenda talvez tenha
algum fundo de verdade.
O que acontece com o controle de tronco quando a criança permanece sentada em “W”
Na
postura em “W”, a criança experimenta um grande aumento da base de
sustentação quando comparada com outras posturas sentadas, isso lhe
garante maior estabilidade estática e menor necessidade de ajustes
posturais. Para entender o que isso significa, podemos comparar ao que
acontece com nosso equilíbrio quando, de pé, afastamos as pernas (em
outras palavras: ampliamos nossa base de sustentação). Para quem nunca
ficou bêbado, saiba que nesta postura fica muito mais fácil manter o
equilíbrio, sendo inclusive possível voltar pra casa ainda como um ser
bípede.
Mas voltando ao assunto: Quando sentada em “W”, o centro de
gravidade dificilmente ultrapassará a sua base de sustentação (a área
ocupada pelo “W”), desta forma, os músculos do tronco terão pouco
trabalho para manter o equilíbrio. Obviamente equilíbrio e estabilidade
são coisas boas, no entanto, a instabilidade é essencial para
desenvolver reações posturais e força nos músculos do tronco.
O
problema é que o “W” é tão estável que não permite à criança exercitar
seu equilíbrio, também limita as rotações de tronco e as transferências
de peso laterais como aquelas que realizamos para alcançar um objeto.
Uma
criança pode escolher sentar-se em “W” simplesmente por não ter de se
preocupar com equilíbrio enquanto manipula um brinquedo. Entretanto esta
também é uma postura muito conveniente para crianças com disfunção
neuromotora, particularmente naquelas com hipotonia de base. Assim,
crianças com síndrome de Down, diplegia, e também naquelas com
mielomeningocele (devido à fraqueza de tronco) podem preferir sentar-se
em “W” por causa de sua dificuldade natural em manter o equilíbrio de
tronco.
Como resultado, ocorre um atraso nas aquisições de controle
de tronco e equilíbrio devido ao não uso. Como a rotação de tronco está
comprometida na postura em “W”, a orientação na linha média é afetada.
Além disso, pela falta de transferências laterais e da capacidade de
cruzar a linha média (levar a mão esquerda a alcançar um objeto no lado
direito do corpo), a criança tende a usar a mão direita no lado direito
do corpo e a mão esquerda no lado esquerdo do corpo, afetando o
desenvolvimento da dominação manual.
Ponto de vista ortopédico
Quando
sentada em “W”, os quadris encontram-se no limite a rotação interna,
predispondo a criança a problemas ortopédicos futuros. Nesta posição
anormal, o risco de luxação do quadril é preocupante. Além disso, esta
posição anormal favorece a instalação de encurtamentos e contraturas
musculares, particularmente nos isquiotibiais, adutores do quadril e
tríceps sural.
A posura em "W" também pode afetar o desenvolvimento
ósseo, favorecendo a anteversão da cabeça do fêmur e rotação interna da
tíbia.
O que fazer?
Se
você lidando com uma criança sem disfunção neuromotora, orientações
simples podem ser utilizadas com sucesso já a partir do primeiro ano de
vida. Se você perceber uma freqüência na postura em “W”, basta ajudá-la a
modificar a posição com suas próprias mãos, guiando-a, por exemplo,
para a postura de pernas cruzadas e conversando com ela explicando que
ela precisa endireitar as perninhas ou algo do gênero (para aqueles sem
intimidade com o mundo infantil, não adianta nada falar algo como: por
favor, rode externamente sua articulação coxo-femoral de modo a
manter-se sentada em uma postura motoramente adequada). O fato de uma
criança sem disfunção neuromotora sentar-se em “W” é muito mais um
hábito do que uma necessidade. Assim, desencorajar o hábito é a melhor
pedida.
Quanto às crianças com disfunção neuromotora, bem, agora o
buraco é mais embaixo, pois se forem crianças que já se acostumaram ao
“W”, elas podem ficar muito inseguras e irritadas ao serem forçadas a
assumir qualquer outra postura sentada. Neste caso, a ajuda dos pais é
fundamental para desestimular o sentar em “W” em casa. Além disso,
envolver a criança em atividades lúdicas manuais nas quais elas
permaneçam em qualquer outra postura que não o “W” irá ajudar no
desenvolvimento dos músculos do tronco e desenvolvimento do equilíbrio.
Fonte: http://fisioterapiahumberto.blogspot.com.br/2010/03/sentado-em-w.html